O texto mais lindo e verdadeiro que eu li...
Um nocaute pra mim...
De autoria do Fabrício Carpinejar, a crônica é tirada do seu novo livro "Ai Meu Deus, Ai Meu Jesus" (Bertrand Brasil,
256 páginas), seleta de seus melhores textos sobre sexo e amor.
MEDO DE SE APAIXONAR
Arte de Gustav Klimt |
Você tem medo de
se apaixonar. Medo de sofrer o que não está acostumada. Medo de se
conhecer e esquecer outra vez. Medo de sacrificar a amizade. Medo de
perder a vontade de trabalhar, de aguardar
que alguma coisa mude de repente, de alterar o trajeto para apressar
encontros. Medo se o telefone toca, se o telefone não toca.
Medo da curiosidade, de ouvir o nome dele em qualquer conversa. Medo de inventar desculpa para se ver livre do medo. Medo de se sentir observada em excesso, de descobrir que a nudez ainda é pouca perto de um olhar insistente. Medo de não suportar ser olhada com esmero e devoção. Nem os anjos, nem Deus agüentam uma reza por mais de duas horas. Medo de ser engolida como se fosse líquido, de ser beijada como se fosse líquen, de ser tragada como se fosse leve.
Você tem medo de se apaixonar por si mesma logo agora que havia desistido de sua vida. Medo de enfrentar a infância, o seio que a criou para aquecer suas mãos quando criança, medo de ser a última a vir para a mesa, a última a voltar da rua, a última a chorar.
Medo de ser roubada e pedir de volta |
Você tem medo de oferecer o lado mais fraco do corpo. O corpo mais lado da fraqueza. Medo de que ele seja o homem certo na hora errada, a hora certa para o homem errado. Medo de se ultrapassar e se esperar por anos, até que você antes disso e você depois disso possam se coincidir novamente. Medo de largar o tédio; afinal, você e o tédio, enfim, se entendiam. Medo de que ele inspire a violência da posse, a violência do egoísmo, que não queira reparti-lo com mais ninguém, nem com o passado dele. Medo de que não queira se repartir com mais ninguém, além dele. Medo de que ele seja melhor do que as suas respostas, pior do que as suas dúvidas. Medo de que ele não seja vulgar para escorraçar, mas deliciosamente rude para chamar, que ele se vire para não dormir, que ele acorde ao escutar a sua voz. Medo de ser sugada como se fosse pólen, soprada como se fosse brasa, recolhida como se fosse paz.
E o medo de se prender e não querer mais largar |
Meu coração nas tuas mãos |
Medo de faltar às aulas e mentir como foram. Medo do aniversário sem ele por perto, dos bares e das baladas sem ele por perto, do convívio sem alguém para se mostrar.
Medo de enlouquecer sozinha. Não há nada mais triste do que enlouquecer sozinha.
Você tem medo porque já está apaixonada.
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